Fomos eu e minha afilhada à cartomante. Pensava: "em casa de ferreiro, santo de casa não...". Eu já tinha dito: "o namorado não volta! Não serve para você... desista, minha querida". Não adiantou. Ela, na sua meninice de 15 anos, resolveu sofrer de novo e me intimou: "Ou você me leva à cartomante, ou eu vou sozinha".
Fomos. Fazia um friozinho de início de noite, tudo embranquecido sob uma chuvinha rala, dando uma falsa impressão de limpeza àquele bairro de classe média.
A casa era simples, grande e limpa. Era um consultório, pois dava para perceber que não servia como moradia. "Entro sozinha, ou senão nem vou". Foi. Fiquei esperando. O veredicto foi o mesmo: "O menino não serve, virá outro etc."
Acudi a choradeira, batendo de leve na porta. Ela chorava as pesadas lágrimas da primeira desilusão amorosa. Caudalosamente, soluçava de se ouvir de longe. Sentei-me ao seu lado e a cartomante, mesmo sem que eu desejasse, consultou imediatamente um lindo baralho colorido e me perguntou: "Você tem um negócio, não é?"
Realmente, eu tinha um pequeno negócio, mas tão pequeno que custei a me lembrar e achei estranho o fato de ela falar justamente daquilo que não me era importante e não me dava lucro algum, dentre as tantas coisas que eu faço.
Com o olhar grave e o rosto sério, ela vaticinou: "Esse seu negócio, que é seu ganha-pão, vai falir e você vai perder tudo que você tem, a menos que..."
Eu, curiosa, repeti: "a menos que..." e ela me explicou que eu precisaria fazer uma série de "trabalhos espirituais" para me livrar do problema. Não perguntei o que era, e nem quanto custava. Tomei conhecimento e vim embora.
Dois anos se passaram e eu não mexi com nenhuma influência espiritual. Na semana passada, saí do tal negócio definitivamente, sem ter falido. A perda não ocorreu. A menina trocou de namorado e, agora, já mais madura - 17 anos - derrama ainda grossas lágrimas por um novo amor, e muitas derramará pelos próximos.
A vida seguiu seu rumo e eu fiquei a me perguntar quanta gente acaba ouvindo coisas negativas numa cartomante, numa sensitiva, e o quanto isso pode influenciar uma pessoa e tirar-lhe a segurança de vencer. Por isso eu creio que uma vidente precisa trabalhar sempre levando em conta uma porcentagem de acerto e explicando isso ao seu cliente. Assim se evitam ocorrências piores.
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